quarta-feira, 10 de outubro de 2012


"Pra lá do arco-íris"

"Com texto baseado na obra da escritora Andrea Sophia, "As Crianças Encantadoras de Música e o Arco-Íris", o espetáculo Prá Lá Do Arco-Íris (...) tem linguagem dinâmica e envolvente, inspirada em desenhos animados, conta as aventuras de Cenzo, um garoto comum e sem cor que vivia insatisfeito em sua cidade natal, Fumaçópolis. Até que um dia, acidentalmente, é transportado para um mundo mágico e cheio de sons chamado Musicolândia. Lá faz novos amigos e descobertas, além de muita confusão envolvendo um grande mistério.  Direção Polyana Horta. (BH/MG) (Fonte: http://www.soubh.com.br/plus/modulos/agenda/ver)

Veja vídeo ilustrativo em: http://youtu.be/KmDrHT1PIHA

       Assistir a um espetáculo teatral elaborado para crianças é para uma adulta uma tentativa de ampliar sua própria criança e desenvolver novas formas de olhar para o mundo e para o outro. Digo isso porque a simplicidade e a objetividade são características do mundo dos pequenos que vamos perdendo no decorrer da construção de nossa máscara social e adulta. De qualquer forma, é possível enxergar a vida que está por trás deles, isto é, dos atores e atrizes, das cores, dos sons, enfim, da proposta lúdica que nos fazem no ambiente teatral. Aqui vou tentar descrever o que pude ver e perceber diante deste espetáculo, como forma de exercitar minha própria capacidade crítica e lúdica...
        Inicialmente o palco é tomado por luzes e objetos, sem a presença de atores. Uma música toca no aparelho eletro-eletrônico, nos convidando a entrar num jogo no qual os sons parecem vir do além, do além daquele momento e também do além daquele espaço, como se sua fonte não estivesse ali no mesmo ambiente que nós. Me parece que esta opção, de tratar o som musical como elemento de fundo, que não deve ser "pensado" porque está ali para colorir nossas impressões, não se coaduna com a nossa atualidade... a perspectiva teatral, tantos já disseram, se estabelece e realiza no "ao vivo" aqui e agora, e a musicalidade do ambiente teatral precisa nos trazer para um mundo presente, onde todos estamos em conjunto, brincando de experimentar outras possibilidades de viver... Mesmo reconhecendo que há questões de gosto envolvidas nesta afirmação, minha reflexão vai no sentido de que esta opção pela música tocada no aparelho eletro-eletrônico que somente serve de fundo para as ações dos objetos e personagens na cena já não se comunica com o espectador educado pela imagem em movimento e que vive diante das mídias de imagem em movimento. E portanto deixa a perspectiva teatral fraca, sem revelações para o espectador atual, criança e adulto.
        Em termos do estilo ao qual se poderia afiliar o espetáculo "Pra lá do Arco-íris", percebe-se que esta não foi uma preocupação levada muito adiante pela encenação. Ao mesmo tempo ve-se cenas interessantes e sem fala, cenas dançadas e cenas (muito) faladas, sem que nenhuma predominância nos indique uma perspectiva de aprofundamento numa linguagem. Vemos uma encenação fragmentada, com momentos interessante e outros frágeis, de modo que sua irregularidade não consegue absorver a fantasiação e conduzi-la para novos tempos e espaços... vemos um espetáculo que não se decidiu a perseguir um desejo, apenas realizou ideias misturadas.
       A plasticidade da cena corresponde à mesma fragmentalidade descrita em torno de seu estilo. Biombos, móveis, objetos e figurinos não apresentam uma unidade, sem querer aqui solicitar nenhum purismo. Os biombos não traduzem um espaço, por serem pequenos e, com licença para dizer, mal executados tecnicamente. Os objetos são visivelmente inadequados para o vai e vem de movimentos e correrias nos quais são usados, como se o cenotecnista acreditasse que eles seriam apenas vistos, e não manipulados. Os figurinos traduzem um maniqueismo entre o cinza e as cores, como se o cinza fosse necessariamente triste e o colorido necessariamente alegre... É pena, porque nem uma tribo, a dos moradores de "Musicolândia", nem a outra, dos moradores de "Fumaçopolis", se mostra influenciado por suas vestes ou elas definem seus carácteres. Ambos se comportam de maneira atabalhoada e estereotipada, sem que seja possível perceber por seu modo de ser e de agir a diferença entre estas duas tribos.
       Sei o quanto é difícil realizar um espetáculo de teatro no nosso país, com todas as necessidades de uma estreia, de um projeto, de um orçamento. Mas ouso querer, desejar que cada trupe se esforce por realizar de fato uma proposta de ação lúdica e de inventividade dentro de suas possibilidades. A emoção, ou a capacidade de se mover do próprio espaço em direção a novos movimentos e pensamentos, é em última instância o objetivo do teatro, penso. E "Pra lá do Arco-íris" se perde, sem objetivo claro, sem nos propor como espectadores um projeto, uma medida de interação e convivência. Fica lá no palco, meio sozinho, sem nos ver e sem nos dar a oportunidade de entrar no seu mundo. Não porque os atores não nos vejam, ao contrário nos olham e falam conosco e para nós, mas porque a parede invisível que separa palco e plateia está incerta e cambaleante, sem certeza de qual é seu lugar nesta história.
       Espero que a vida do espetáculo amplie sua percepção de proposta estética (porque ela deve estar lá, mesmo que ainda inconsciente), e que possam sair do mundo da televisão para fazer um teatro vivo e incandescente. As crianças sorriem, comentam, mas não levam nenhuma marca corporal densa para suas vidinhas, porque são tratadas como "sentadores de cadeiras", levados a escutar, escutar, escutar e aplaudir com o adulto no final. Luto por um teatro teatral e vivo!!!!!!
Até a próxima.

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