sexta-feira, 17 de janeiro de 2014

Vazio é o que não falta, Miranda




Direção e dramaturgia: Diogo Liberano
Assistência de Direção: Thaís Barros
Elenco: Adassa Martins, Caroline Helena, Flávia Naves e Natássia Vello
Direção Musical: Philippe Baptiste
Cenário: Rafael Medeiros
Figurinos e Caracterização: Adassa Martins e Natássia Vello
Iluminação: Diogo Liberano e Flávia Naves
Preparação Vocal: Verônica Machado
Direção de Produção: Caroline Helena e Diogo Liberano
Registro Audiovisual e fotográfico: Carolina Calcavecchia e Thaís Grechi
Correalização: Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ)


Quatro atrizes e um diretor tentam encenar Esperando Godot de Samuel Beckett, sem sucesso”.

Como é a teatralidade na contemporaneidade? Se pensarmos no conceito de teatralidade podemos nos questionar em conjunto com Patrice Pavis (SP: Perspectiva, 1999), quando nos diz que:

            “é preciso busca-la no nível dos temas e conteúdos descritos no texto (espaços exteriores,      visualizações das personagens);
            é preciso, ao contrário, buscar a teatralidade na forma de expressão, na maneira pela qual o texto fala do mundo exterior e do qual mostra (iconiza) o que ele evoca pelo texto e pela cena?”

Podemos pensar que convivemos numa época saturada, seja de estímulos seja de informações, que amplifica o vazio. Ou, noutras palavras, numa época plena de intensidades mentais e afetivas, que se organiza no caos. Numa época em que as pessoas fazem autodescrições mais que análises, reivindicam a autoria de suas histórias no mundo, buscam demonstrar  sua ideologia na sua aparência e, guardadas as devidas proporções desta possibilidade, vivem absolutamente solitários em seus mundos artificiais e eletrônicos.

Numa tal época, tanto os temas e conteúdos expressos nos textos escritos, quanto os textos corporais, nos ícones que eles evocam e na cena como exprimível do mundo, estão as teatralidades. Estão as possibilidades de manifestação do ser no mundo, estão os vazios que proporcionam as trocas estéticas e a construção de sentidos.

Em “Vazio é o que não falta, Miranda”, passamos minutos em presença de seres super-humanos, que se expõe numa tentativa de construir atmosferas. Mais que contar uma história, que seria plena de vazios por sua temática da solidão e do indivíduo em sua elaboração de razões para ser e estar, “Vazio” nos coloca em pleno confronto com a “aventura da conservação do si mesmo” (Sloterdijk, 2001). Somos impactados por circunstâncias de interpelação direta, por desestruturações de expectativas comuns ao teatro dramático. Vivemos um dos processos do pós-dramático: “ trata-se aqui de um teatro especialmente arriscado, porque rompe com muitas convenções. Os textos não correspondem às expectativas com as quais as pessoas costumam encarar textos dramáticos. Muitas vezes é difícil até mesmo descobrir um sentido, um significado coerente da representação. As imagens não são ilustrações de uma fábula. (...). Este trabalho teatral é essencialmente experimental, persistindo na busca de novas combinações ou junções de modos de trabalho” (Lehman, Cosac Y Naif, 2007).

As atrizes se doam para uma composição em processo, desenvolvendo mais um projeto que um roteiro propriamente dito. Ao que parece este projeto tem um começo, algumas chaves de mudança de atmosfera e um fim. Mas tudo pode ser rearranjado, segundo indicações de um diretor-personagem, que se imiscui todo o tempo na presentação das imagens e ideias. Cinco personas ficcionais se debatem contra uma plateia indecisa... o que esperar de toda aquela mistura de atitudes, discussões e ações cênicas? Pequenos momentos de percepção lúcida de que somos fragmentos e fragmentados; raros momentos de prazer intenso por não sermos aqueles seres humanos desumanizados. Mas, neste caso para mim mesma, também intensos momentos de percepção criativa de como fazer a cena ao vivo para as pessoas que somos hoje, com várias ilusões, truques e mentiras, como o mais teatral dos teatros!

Divertido, controverso, poético, intrigante, provocador... estes adjetivos me ocorrem para nomear a experiência de compartilhar o “Vazio”, que de fato “não falta, Miranda”.

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